A sincronicidade dos arquétipos e o destino [artigo retirado do livro astrologia do destino da Liz Greene]

 Quando eu era jovem, gostava muito de dançar e principalmente de bailes a fantasia, que estavam em voga em Berlim na década de 20 e no começo da década de 30. Acho que foi em 1928 que dancei duas noites a fio, quase sem dormir. Na manhã seguinte, domingo estava bastante estafado. Assim, não fiquei nem um pouco contente quando fui acordado pelo telefonema de um amigo, convidando-me para uma festa que ele ia dar naquela tarde. Recusei, mas o poder da persuasão do meu amigo acabou levando a melhor e fui. Ao entrar na sala meus olhos captaram a visão de uma bela moça; quando meu amigo me apresentou a ela, disse o seguinte: "Dr. Adler - Sra. Adler". Esse tipo de coisa chama a atenção, pelo menos chamou a minha. Conversamos bastante, um estava bem curioso a respeito do outro. Assim decidimos continuar a conversa em outra ocasião. Depois disso encontramo-nos várias vezes. Em resumo, esse primeiro encontro, se não ainda de almas iguais, mas apenas de nomes iguais, levou a uma amizade íntima e muito fecunda. Porém - e aí está o nó da questão - resultou que minha xará tinha visto Jung e estava profundamente envolvida pelas ideias dele. No autêntico estilo da anima ela despertou minha curiosidade sobre esse estranho homem e sua Psicologia Analítica; até então eu tinha estado muito mais interessado em Freud. Foi assim que tudo começou. Aqui o destino de duas pessoas foi profundamente entrelaçado num padrão complexo por causa do que, em linguagem comum, só podemos chamar de encontro casual. Acaso, destino, formento da prontidão interna para a mudança e direção - como é possível desmaranhá-los? De qualquer forma, podemos perceber aqui uma "coincidência significativa" entre o destino interno e os acontecimentos externos.

 O Dr. Adler cita outros exemplos pessoais dessa aparente emergência de um padrão secreto na vida comum onde se tem a impressão de que "alguma coisa" está trabalhando para moldar a direção em que a pessoa se desenvolve. Frequentemente só é possível ver a importância dessas ocorrências em retrospecto; essas ocorrências nem sempre chamam especialmente a atenção, como a que foi citada acima. Mas os encontros "causais" que, como deus ex machina do teatro grego (é uma expressão em língua latina com origem no grego que significa literalmente "Deus surgido da máquina", e é utilizado para indicar uma solução inesperada), aparecem subitamente no caminho da pessoa como arautos de uma crise ou de uma mudança de grande significado para o futuro, não são necessariamente encontros com pessoas significativas. O acontecimento pode não significar não significar nada para os outros mas se encontra ressonância dentro da pessoa, provoca uma forte sensação de que algo importante está ocorrendo, sensação que é muito difícil de ignorar. Tenho visto, no mais das vezes darem a ela o nome de sentimento de "destino", como se a pessoa tivesse chegado a um nó, ou tivesse o presságio ou intuição de ter atingido uma encruzilhada. Embora talvez algumas pessoas sejam mais sensíveis que outras a essas ocorrências - talvez devido a função intuitiva que tende a extrair conexões significativas com bastante rapidez - elas não se limitam absolutamente aos que se interessam pelas artes esotéricas ou pela psicologia profunda. Acontecem com todos e até a alma mais prosaica, se lhe derem chances, terá uma história estranha para contar. Essas "coincidências significativas" invocam uma convicção de que, por baixo do mundo visível, existe um outro mundo que se introduz nas ocasiões oportunas através da experiência da ordem predestinada. O Dr. Adler levanta a questão da relação entre o interior e o exterior, e da possibilidade de os dois não serem tão díspares, desiguais e diferentes como a princípio parece.

 Existe dentro de nós algum destino que prefigura o padrão de nossa vida, ou ela é moldada, ou nós a sentimentos tão intensamente e nos lembramos tão bem delas devido a uma necessidade interior? Ou existe uma coincidência entre necessidades interiores e acontecimentos exteriores, uma interconexão de dentro e fora, que torna a divisão em duas esferas irrelevantes e até errônea?

 Acredito que essa seja a conexão entre "alma" e "destino" que esteja incorporada nas imagens míticas que investigamos nas páginas anteriores. Como vimos, os mitos cruzam as fronteiras entre "interior" e "exterior" manifestando-se nos dois níveis. Porém, se os mitos refletem um padrão básico, o que então, preenche o padrão com acontecimentos tão estranhos como o encontro do Dr. Adler com a Sra. Adler? Todo astrólogo encontra o "lugar intermediário" do mito em todo horóscopo pois o padrão astrológico parecem descrever tanto o caráter quanto o destino como se fossem a mesma coisa. Os padrões míticos dos signos zodiacais são uma ilustração particularmente clara de como um modo interior de percepção da existência e experiência coincide com um padrão de vida exterior. Mas alguma "outra coisa" opera para provocar as "coincidências significativas" que nos lembram de nossa unidade com nosso mundo. Jung achava que as experiências sincrônicas que unem o interior e o exterior pareciam apoiar-se em uma base arquetípica. Em outras palavras, existe algo funcionando que transcende a divisão artificial entre a psique (interior) e o ambiente físico (exterior) - um padrão ordenado inerente que une as pessoas e suas experiências concretas da vida em um significado comum. Creio que a maioria dos astrólogos tem experiência dessa "base arquetípica" como uma teoria geral para explicar por que um posicionamento planetário, ou um trânsito, ou um aspecto progredido correlacionam uma qualidade ou tendência interior com um determinado tipo de experiência, tal como o encontro descrito pelo Dr. Adler. Por mais causal e mecanicista que o astrólogo se torne - e alguns, compreensivelmente, procuram um "efeito" físico dos planetas sobre a vida humana - é difícil explicar satisfatoriamente a ocorrência espantosa, e às vezes profundamente irônica, dessas "coincidências significativas" a que Jung dá o nome de sincronicidade.


[ ASTROLOGIA DO DESTINO - LIZ GREENE ]